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A cara do trabalho infantil

Crianças que trabalham apesar das proibições são na maioria meninos negros


Texto e fotos: Ana Beatriz Leal, Isadora Vasconcelos e Milena Caetano


Na noite de sexta-feira, dia 25 de agosto, duas crianças foram levadas à Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário (DEPAC) do bairro Tiradentes após denúncias de que elas estavam vendendo doces no semáforo por volta das 22h sem o acompanhamento de algum responsável. Segundo o projeto Criança Livre de Trabalho Infantil, há 29.660 crianças entre cinco e 17 anos trabalhando no Mato Grosso do Sul.

Anderson Marssaro, policial militar há 15 anos, recebeu ordens para sair do seu ponto e buscar as crianças. Elas haviam sido deixadas sozinhas por uma tia vendendo os doces nos semáforos da Avenida Mato Grosso. Marssaro relata que o ocorrido não é um caso isolado, mas que as crianças trazidas à delegacia geralmente estão acompanhadas dos pais. Ele explica que durante o horário comercial, crianças que são encontradas vendendo no semáforo ou exercendo qualquer tipo de atividade irregular de trabalho são levadas à Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA) ainda sim, pelo horário que a polícia foi acionada para buscá-las, a DEPAC acabou sendo o destino dos pequenos.

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As crianças que aparentavam ter em média cinco anos mal sabiam falar o nome completo de sua mãe. Em casos assim, é necessário acionar o Conselho Tutelar, o qual decide quais medidas serão tomadas. Assim, o órgão foi chamado e, após quase duas horas de espera, a conselheira chegou e permaneceu com os irmãos até os pais serem encontrados e as crianças retornarem aos seus responsáveis.

O policial explica que em todos esses anos de profissão, o ocorrido do dia 25 foi marcante ao seu ver. “Quando a gente chega, os pais falam que as crianças só estão lá porque não têm com quem ficar, e não porque estão trabalhando”. Logo, no momento do flagrante, o crime não está sendo de fato efetivado. Anderson explica a problemática da exposição das crianças ao comércio infantil, especialmente nas ruas e no período noturno. “Os próprios pais usam os filhos, eles geram mais comoção”, lamenta o policial.

O caso registrado não é de forma alguma incomum, segundo levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa (IBGE), em 2017, cerca de 2,7 milhões de crianças e adolescentes, de 5 a 17 anos de idade exercem algum tipo de trabalho, incluindo domésticos, trabalho em lixões, carvoarias, pedreiras ou como vendedores de rua (nos sinais e como ambulantes). Ainda de acordo com essa pesquisa, essas crianças e adolescentes trabalham na informalidade, com quase nenhuma remuneração, expostos a locais perigosos e insalubres, sendo que 70% são do sexo masculino, e 63% são negros.

Essa estatística demonstra que a desigualdade tem cor e rosto. A maioria das crianças e jovens que estão nessa situação também passam por outras inúmeras fragilidades. É inegável que o trabalho infantil deve ser combatido por meio de políticas públicas, mas sem um viés real e sensível ao contexto dessas famílias, os apontamentos se tornam somente preconceitos. Julia Almeida, de 46 anos, é presidente do Recanto da Criança, uma organização de convivência e fortalecimento de vínculos. Ela reflete sobre a visão social em cima das famílias que estão vulneráveis. “A nossa perspectiva não é de julgamento, e sim de acolhimento”.

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O Recanto é uma Organização da Sociedade Civil (OSC), tem parceria com a Secretaria Municipal de Assistência Social (SAS) e segue a Política Nacional da Assistência Social. Seus recursos são obtidos a partir de emendas parlamentares, contribuintes, parceiros, empresas e programas como o Mesa Brasil Sesc. O local recebe verbas para 60 alunos, apesar dos 70 que estão matriculados. Com uma variedade de projetos, a OSC tem oficinas de tênis, musicalização infantil, aulas de informática, balé, além de consultório odontológico. A organização acolhe crianças dos 6 aos 15 anos, e, apesar de alguns casos em que a SAS envia uma criança em situação de vulnerabilidade, a maioria dos alunos não está em risco.

Edna Leite Cunha Matos, de 68 anos, é assistente social e há 15 atua no Recanto da Criança. Ela conta que o local é um ambiente preventivo, onde pais e tutores buscam auxílio. O perfil das famílias que buscam o Recanto são diversos. “Moradia precária, alcoolismo, dependência química, pais presidiários, desemprego, essas são as vulnerabilidades”. Edna complementa que o objetivo da instituição é contribuir junto às famílias para a criação dessas crianças.


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