Mais que movimentar o corpo, os exercícios físicos ajudam a cuidar da mente
Ingrid Protásio e Roberta Dorneles
“Tinha depressão e ansiedade e me tratei através do esporte, pratico há mais de dois anos o strongman” (atletismo em que os competidores demonstram suas forças em variados pesos diferentes). Quando ele arremessa um pneu de caminhão, é como se estivesse arremessando seu antigo eu, foram 60 quilos eliminados e com eles foram junto a sua baixa autoestima, seu sedentarismo e a falta de disposição. “Eu pesava 190 quilos e agora peso 130 e com certezaminha vida mudou para melhor”, relata Lennon Barbosa Penedro, 32 anos. Com um sorriso, não nega seu orgulho e felicidade em romper barreiras e assim como seu esporte preferido, em “arremessá-las para longe". O hábito constantede praticar exercícios traz benefícios, a movimentação diária do corpo estimula a oxigenação no cérebro e ativas alguns neurotransmissores fundamentais. Entre os principais está a serotonina, conhecida como o hormônio da felicidade, que melhora não só o bom humor, mas também a qualidade do sono. Há também a dopamina, que pode atuar de diferentes formas no sistema nervoso, principalmente no humor e no prazer, que podem ser detectados após a prática de uma série de exercícios, musculação ou mesmo uma caminhada. E a endorfina que atua como um analgésico, aliviando o estresse e auxiliando na redução da ansiedade. Ao lado de Lennon, um bicampeão brasileiro de queda de braço, Carlos Eduardo, 43 anos, é conhecido como braço de ferro. Mudou sua vida com o esporte, melhorando sua rotina e a qualidade de vida. É a prova viva de que esportes não só melhoram o corpo, mas principalmente a mente: “praticar esporte muitas vezes é melhor do que ir ao psicólogo”.
Lennon Barbosa carregando pneus que podem chegar a 400 kg cada (foto: Campo Grande News)
Quem manda nesse corpo? Sou eu
Às 6 horas da manhã, quando o sol começa a iluminar o dia, ela chega à praça Coophasul. Bem comunicativa, conversa com seus colegas de aula. Em sua camiseta, uma frase que avisa se tratar de uma pessoa decidida (“Quem manda nesse corpo sou eu”), que movimenta o corpo e que não deixa pensamentos negativos dominarem sua mente. Em suas mãos,um cabo de vassoura, sim um cabo de vassouramesmo, ele será utilizado nos exercícios que a aluna Domingas de 57 anos irá realizar. A professora que ministra a aula logo acomoda o aparelho de som e o liga, a música escolhida é a Dancing Queen, do grupo ABBA. Sorridente, começa a dançar e a movimentar-se, animadapara a aula do dia.
Todas as terças-feiras, ela vai à praça próxima a sua casa para praticar atividades físicas – mais que exercitar o corpo, ela exercita a mente. “A gente vem para rir, interagir e principalmente se divertir”.
Domingas faz parte do grupo de atendimento ao idoso (ATI), que recebe suporte da Fundação Municipal de Esporte (Funesp) que oferece aulas em praças da cidade com acompanhamento de uma profissional de Educação Física. O projeto tem como objetivo ajudar os idosos não só a praticar atividades físicas, mas a não se sentirem sozinhos e depressivos. Os alunos que participam do projeto gostam das aulas não apenas por cuidarem do corpo, mas por terem a oportunidade de sorrir, interagir e dançar.
Domingas se exercitando no grupo ATI (foto: Ingrid Protásio) “Se não fosse a prática de exercícios, acho hoje que não estaria andando” Katarina, 61 anos, é professora particular de inglês. Há 30 anos sofre de fibromialgia (condição que porovoca dor nos tecidos fibrosose musculares), viveu metade de sua vida no Japão e trabalhava em um campode golfe ao ar livreem uma cidade japonesa que registra baixas temperaturas e neve no decorrer do ano. Durante o inverno, os sintomas tendem a se agravar por ser uma doença ligada ao sistema nervoso. Estranhou essas dores se intensificando no frio, procurou auxíliomédico, mas naquelaépoca ainda não havia conhecimento sobre fibromialgia, os primeiros diagnósticos surgiram nos anos 1990.
Voltou ao Brasil para investigar e tratar a doença e com o diagnóstico foram receitados os medicamentos que não surtiram efeito, então foram indicadas atividades físicas. Não se adaptou à academia, por ser um ambiente fechado e barulhento, então ela optou por caminhar e andar de bicicleta ao ar livre pela nostalgia dos tempos em que morava no Japão. Hoje faz 7km de bicicleta e 40 minutos de caminhada todos os dias e sentiu uma melhora significativa nas dores musculares causada pela fibromialgia.
Paulo e Alencar também são exemplos de pessoas que acharam refúgio da rotina nas atividades físicas ao ar livre: “você está caminhando e colocando a cabeça em ordem, vendo as pessoas e encontrando os amigos”, comenta Paulo, 73 anos aposentado de uma vida estressante de comerciante. O engenheiro de 55 anos, Alencar, também afirma que sentiu muita diferença no rendimento dos seus afazeres do dia a dia. “A disposição é outra, desde fazer café até arrumar a cama, a hora de vir é o momento de vencer a vontade de ficar em casa, mas depois que você vem, fica muito mais satisfeito de ter vindo, há um prazer que o corpo e amente consequentemente sentem”.
Controlando a mente Uma prática que busca trabalhar o corpo e a mente, trazer consciência, buscar estar presente de corpo e alma, é a arte de perceber cada detalhe. O movimento das árvores, o cantar dos pássaros, a respiração que vai e vem, cada sentir do corpo e aprofundar em cada pensamento que vem à mente. O yoga é uma prática de origem indiana que trabalha técnicas de meditação e respiração juntamente com o movimento do corpo. Ajudam na qualidade de vida e no autoconhecimento, trazendo flexibilidade e maior controle das emoções. Foi com essa prática que a professora de Educação Física Aline Szucs mudou sua vida. Em 2007, ela passou por uma grande perda familiar e como refúgio buscou algo que a acalmasse e trouxesse conforto, logo encontrou no yoga o caminho do autoconhecimento. Inicialmente, ainda atuando como professora, buscou estudar a fundo as origens e as suas ferramentas, mas por ser uma atividade extremamente rica em significados e técnicas, preferiu começar pela prática para senti-la antes de entendê-la. Então, em 2019, realizou sua formação e começou a atuar como professora. Trabalhando no hospital regional, tem o desejo de introduzir a prática aos servidores, por atuarem em um local extremamente delicado, consequentemente, podem ficar mentalmente doentes. Diferentemente da professora, Marina, empresária de 47 anos introduziu o yoga há duas semanas em seu cotidiano, influenciada por uma amiga. Começou a frequentar as aulas da professora Aline e mesmo em pouco tempo, diz ter sentido algumas diferenças. “As pessoas acham que é bobagem, mas é uma experiência muito profunda que faz a gente enxergar e julgar muito menos, o yoga não é só um alongamento, é algo espiritual, mexe muito com a gente”. A empresária busca autoconhecimento há cinco anos, por trabalhar com seu próprio negócio, sua rotina acaba sendo estressante e cheia de preocupações: “busco sempre pelo divino, pela conexão com Deus”.
Relato de experiência
Em seu segundo dia de prática, Marina experimentou sensações diferentes, no primeiro dia foi tomada por uma ansiedade que não deixou que as coisas fluíssem naturalmente. No segundo dia, ela se permitiu mais, durante a aula, na posição “postura de cadáver”, na qual os praticantes são convidados a deitar no chão em postura de cadáver e a visualizar um fundo branco, como forma de limpeza de pensamentos. Visualizou inúmeras cores, como um arco-íris, a cor rosa predominou e ela então entendeu a mensagem, “agradeci ao sagrado feminino, porque acho que as cores têm ligação”.
Os benefícios da prática
Aline sempre que pode busca pessoas para a prática. Seja on-line ou presencialmente, os benefícios sempre virão “Quando introduz a prática, você começa a filtrar as informações, a entender o que é necessário para sua vida e o que não é”. Mais do que filtrar, é ter concentração em começar e terminar um propósito, seja ele simples ou mais complexo. “As pessoas perderam o foco, ainda mais hoje em dia que estamos na era da informação, na ‘obesidade’ de informações a todo momento, precisamos fazer um detox desse mundo virtual”.
Servindo como ferramenta para descarregar as turbulências do dia a dia e resultar em uma vida com mais qualidade, segundo a psicóloga Katyelle Alencar, especialista em Terapia Cognitiva Comportamental, práticas de exercícios estão diretamente ligadas ao autocuidado que consequentemente auxiliam no processo da obtenção da autoestima.
Alunos da professora Aline praticando Yoga ao ar livre na Praça Itanhangá (foto: Ingrid Protásio)
Comentários