Mudanças climáticas e crescentes ondas de calor têm causado sintomas que vão além do físico
Ana Carla de Souza e Silva e Carolina Toffanetto
Preocupação excessiva com o clima, angústia ao ver a previsão do tempo, medo dos fenômenos naturais, você já ouviu falar sobre a ansiedade climática? Apesar de parecer novo, o termo não é recente e já vem sendo discutido há um tempo pelos especialistas à medida que as mudanças climáticas do planeta estão avançando ao longo das décadas, mas, afinal, o que é ansiedade climática?
De acordo com a psiquiatra Maria Francisca Maura, a ansiedade climática é um fenômeno de comportamento relacionado a uma expectativa sobre as mudanças climáticas. A médica conta que se trata de uma expectativa ruim em que a pessoa acha que alguma catástrofe vai acontecer em decorrência a essas mudanças e, normalmente, se preocupa como algumas regiões do planeta podem ser impactadas e se realmente vamos ter um futuro e continuação da espécie.
A ansiedade climática é vista como um fenômeno social percebido principalmente nas gerações mais jovens, na faixa dos 20 anos, que se mostram muito preocupados com a situação do futuro. Como é o caso do ativista e estudante de direito Jean Ferreira, de 24 anos, que conta que ele e seus colegas chegam a ficar desesperados com as questões sobre o meio ambiente e mudanças climáticas, sendo temáticas que já levaram, inclusive, à discussão na terapia.
Ativista Jean Ferreira. (Foto: arquivo pessoal)
Jean luta pela causa ambiental e climática e realiza diversos movimentos para expor a situação para políticos e empresários do Brasil todo. Ele conta que começou a militar quando tinha apenas 13 anos e comerciantes queriam derrubar uma árvore centenária na região em que morava. “Quando era criança, adolescentezinho, eu me juntei com os sindicalistas, e eu nem sabia qual era de fato a razão por eles estarem ali, mas eu estava querendo defender aquela árvore”, relembra.
A preocupação com o futuro, também é algo que atinge o empresário Cesar Nogueira, de 55 anos, que afirma temer pela situação de seus filhos e netos, pois as pessoas não parecem se preocupar em como lidar com a situação a longo prazo, mas sim apenas em resolver o problema atual: o calor. Segundo o empresário, as pessoas que realmente têm o poder de mudar alguma coisa ou de começar a reverter a situação não estão sofrendo as alterações climáticas, pois ficam a maior parte do tempo em ambientes climatizados e protegidos do calor externo.
Como as mudanças climáticas têm afetado as pessoas?
As ondas de calor que ocorreram nas últimas semanas no Mato Grosso do Sul e em diversos lugares do Brasil, foram sentidas pelos moradores do município de Campo Grande. A temperatura esteve tão alta, que muitos campo-grandenses, que não trabalham em ambientes com ar-condicionado, precisaram recorrer a algumas formas de aliviar o calor.
A diarista Jéssica Silva, de 32 anos, conta que precisou comprar um ventilador para tentar amenizar os efeitos do clima quente. Já para outras pessoas, nem isso foi suficiente. O autônomo Denis Nascimento, de 47 anos, alega que sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) há dois meses em decorrência do calor, pensando que era apenas pressão alta. Denis teve que ficar 14 dias internado no hospital e ainda sofre com as sequelas deixadas pelo AVC, de vez em quando têm dores de cabeça e dificuldades para enxergar.
Algumas pessoas também tiveram o seu trabalho afetado por conta do clima, como é o caso de Elaine Cristina, de 41 anos, que trabalha como cabeleireira e está enfrentando problemas para aplicar os produtos dos cabelos de suas clientes. Ela conta que tem medo do que pode acontecer futuramente e se preocupa com a sua filha, que ainda é uma criança e já está passando por essas mudanças climáticas e pode ter o seu futuro impactado.
E os impactos para o futuro?
César Nogueira também destaca que o causador dessas mudanças está na maneira que as pessoas tratam a natureza. O empresário acredita que o desmatamento é a principal causa dessas mudanças, pois, de acordo com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o desmatamento libera uma grande quantidade de carbono na atmosfera e consequentemente, acaba contribuindo para o aquecimento global.
Jean Ferreira afirma que ainda é necessário lidar com um outro fator alarmante: a desinformação. Como ativista, Jean é frequentemente alvo de ataques em suas redes sociais e já lidou com revoltas em protestos e eventos do eco ativismo, de pessoas que defendem interesses que nem ao menos as beneficiam.
O ativista afirma que os maiores responsáveis por tantos problemas são as grandes indústrias e empresas, que produzem desenfreadamente para alimentar o sistema de consumo capitalista. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a indústria extrativista tem causado inúmeros impactos na saúde humana, enquanto a indústria têxtil é responsável por 2% a 8% das emissões de gás carbônico no planeta.
A psiquiatra Maria Francisca Mauro, relata que tem recebido em seu consultório jovens cada vez mais desacreditados do futuro, e os mais afetados pelas mudanças climáticas normalmente são pessoas em situação de vulnerabilidade ou que passaram por traumas por conta dos fenômenos naturais. Assim como Jean, é possível perceber que as pessoas têm se preocupado com as mudanças climáticas. Não há como ter certeza do futuro, nem de como a ansiedade climática pode evoluir daqui para frente e as maneiras como poderá afetar a vida das pessoas, mas é preciso se preparar.
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