Gabriela de Jesus e Billyscleyton José. O amor entre uma amazona e um cavalo surgiu no Círculo Militar de Campo Grande, passou por dificuldades e hoje em dia o hipismo os une cada vez mais
Emelin Gabrielle e Sanny Duarte
O cheiro do lugar remete às viagens para a fazenda durante a infância, os cavalos estão sempre no horizonte, pastando pelo campo ou em suas baías. As relinchadas e o barulho dos cascos pisando no chão são ouvidos a cada passo dado no Círculo Militar de Campo Grande. Uma moça da pele clara, olhos cor de mel, cabelos castanhos e longos preso em um coque, com uma blusa de manga comprida preta, calça apropriada para andar a cavalo e botas. Suada e com as roupas sujas, consequência do cuidado com os animais, Gabriela de Jesus, com um sorriso no rosto, nos recebeu no local.
Nascida em Ponta Porã (MS) e filha única, brinca que sua mãe achava que ela tinha que ser um “robozinho” pela quantidade de atividades que fazia durante a infância. Gabriela precisava “se encontrar como pessoa”, praticando balé, piano, natação, inglês, francês, espanhol e hipismo, iniciado aos seus 5 anos de idade no quartel de sua cidade natal. Hoje em dia, aos 28 anos, descreve na biografia de suas redes sociais as suas profissões e talentos. Engenheira Mecatrônica, modelo, “digital creator”, cantora, compositora, gestora de agronegócios e amazona.
Entre muitos cavalos e éguas presentes no local que descansavam para a competição do dia seguinte, Gabriela possui uma afeição maior por Billy, mesmo não sendo sua dona. Antes mesmo de começarmos as perguntas, em uma mesa redonda com banquinhos de madeira, a amazona já comentava sobre a vida dos dois. De forma espontânea, demonstrava a paixão que tem pelo animal. Todo o sentimento que é mostrado nas redes sociais é sentido em cada frase que sai de sua boca sobre o cavalo.
Inicialmente chamado de Billy, mas para incrementar e personificar ainda mais ela o batizou de Billyscleyton José; veio de Dourados (MS) e sua raça é Quarto de Milha. Na baía de número 65 estava o cavalo branco, ao passar as mãos sentimos a maciez do pelo do animal, que expressa a sua felicidade de forma equina. Considerado brincalhão, principalmente pela sua idade, relinchava, bebia água e comia durante a visita. No final de 2022, aos 7 anos de idade, o animal chegou ao local para aprender novos percursos do hipismo, mas apresentava dificuldade.
Após um tempo na Alemanha, no dia 20 de janeiro desse ano, Gabriela teve o seu primeiro contato com o cavalo. Ainda em sua fase adolescente, Billyscleyton tinha medo de saltar, desviava de obstáculos, com receio de objetos coloridos, fazendo com que ela chorasse por não conseguir aquecê-lo para as competições, mas foi melhorando com o tempo. Neste ano, um corte na pata fez com que o animal ficasse parado, sem praticar o esporte durante dois meses.
André é o cuidador de Billy, alimentando o cavalo de manhã e na hora do almoço com ração e no período noturno somente com o “volumoso”, composto de capim. Produtos caros e cheirosos, o “kit Billy” é formado por um xampu para branquear e um perfume para cavalo. “Eu amo dar banho nele, porque eu tomo banho junto, é uma delícia”, conta Gabriela. Considerado o pet da competidora, ela diz que se pudesse o levaria para morar com ela, e tudo o que faz, pensa em como poderá melhorar a vida dele.
O cuidado que ela tem com seu cavalo é grande, ventilador na baia é só uma das coisas proporcionada ao animal. Uma mascará facial protetora é colocada para proteger os olhos dele contra as moscas. Medo de veterinário? Sim, o Billy tem. Durante o episódio do machucado da pata, seu veterinário comparecia até o local diariamente para aplicar anti-inflamatório para retirar a dor, o que causou trauma no animal.
Atualmente Billy até “pede” para usar a máscara, apontando o focinho e “sorrindo”. Ela relata que sente saudade e uma sensação ruim ao viajar e deixá-lo para trás, quando vai até a sua cidade natal ou ao ir ao show da Taylor Swift. Billy chegou a fazer greve de fome durante uma viagem de Gabriela.
As competições e a falta de incentivo
Pula cavalo, pula amazona. Correndo com os cascos na terra, cada salto que é dado pelos obstáculos leva o corpo da competidora a alguns centímetros para cima. Em sintonia, quando as patas da frente chegam ao chão, Gabriela se inclina para frente.
Entre alguns eventos durante 2023, no final do mês de junho, ocorreu um episódio na Competição Estadual na cidade de Dourados. Em um local com muitas pessoas, objetos coloridos e muito barulho, ao entrar na pista, Billy saltou o primeiro, o segundo, o terceiro e o quarto objeto, mas ao chegar no quinto obstáculo que estava em frente da arquibancada, o animal se apavorou com as pessoas, fez uma curva e acabou não conseguindo finalizar o percurso. No segundo dia de competição, melhorou, derrubando menos objetos e no terceiro zerou o percurso sem derrubar nada. Atualmente, ela diz que ele está melhor, que monta com confiança, pois, sabe que ele vai saltar. “Eu passo meu nervosismo pra ele, ele sente tudo o que eu estou sentindo. Porque em campeonatos, quando os cavalos ficam mais agitados, o cara que está em cima, está desesperado. Então ele sente que você está em perigo”. Os percursos são treinados e intensificados para os campeonatos, definidos de acordo com as condições do cavalo.
Gabriela gostaria muito de estar mais incluída nos campeonatos, mas isso se torna difícil por ser um esporte caro e elitizado. A falta incentivo financeiro do Estado dificulta a trajetória da competidora no esporte. Convidada para representar Mato Grosso do Sul na Copa Brasil, que acontecerá na cidade de São Paulo, não terá apoio financeiro, somente a inscrição, tendo que bancar o transporte pessoal, do animal, entre outros gastos. Na internet temos acessos a todo tipo de conteúdo, e é por lá que Gabriela assiste vídeos sobre o hipismo para adquirir cada vez mais conhecimentos sobre o esporte e cuidados com o Billy.
Gabriela beijando Billy. (Foto: arquivo pessoal)
Me declaro para Billy
O coração de Gabriela foi tomado por Billy, fazendo com que sua presença se tornasse algo terapêutico. A emoção desenvolvida durante as competições, seja no choro ou estresse, fez com que se apegasse ainda mais e desejasse a conquista não dos troféus, mas do próprio cavalo.
“Quero me dar ele de natal, dia 10 de dezembro é aniversário dele, se eu não comprar de natal, vou comprar de aniversário. Hoje em dia, o que eu mais quero é ele para mim, vou lá no cartório e registar ele como Billyscleyton José de Jesus. Todas as pessoas precisam ter uma coisa que seja sua válvula de escape, tem gente que vai para a terapia, o Billy é meu terapeuta. Quando eu estou bem, quando eu estou mal, quando eu estou de qualquer jeito, aqui é o lugar que eu fico bem, parece que ele me cura”.
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