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Monumentos culturais sob o olhar indígena

Histórias que ultrapassam gerações e são representadas por construções localizadas em Campo Grande


Brunna Brondani, Mariana Viana, Rebeca Ferro e Sarai Brauna

Fotos: Brunna Brondani


A língua indígena: uma representação cultural viva


Yahíkapunonoe é o que está escrito logo na entrada do Memorial da Cultura Indígena Cacique Enir Terena. A saudação de bem-vindo convida para entrar em um espaço de cultura e memórias coberto com palha de bacuri, sustentado por paredes de bambu e pela história de povos ancestrais. O interior revela artesanatos e pinturas, peças que são retratos dos costumes e do sustento de diversas famílias indígenas.

“A história da nossa comunidade é igual a uma gravidez, que você vai lá, faz um ultrassom e descobre que tem três, que achou que era só a comunidade que ia nascer, nasceu a escola e o Memorial, foi um pacote só’’ disse a atual gestora do espaço cultural , Maria Auxiliadora Bezerra, filha de Enir da Silva Bezerra, mais conhecida como Enir Terena, que dá nome ao local. Foi ela que na metade dos anos 90 iniciou a luta pela organização da primeira aldeia urbana do Brasil, Marçal de Souza, onde se localiza o monumento e a Escola Municipal Sulivan Silvestre de Oliveira. As três obras foram concluídas em 1999.

O espaço tem como regra comercializar apenas artesanatos feitos exclusivamente por indígenas. Segundo a gestora, o preço é decidido pelos artistas e o dinheiro das vendas de suas peças é dado integralmente a eles. O Memorial é uma parte expressiva da vida da aldeia urbana Marçal de Souza, um local livre para a realização de cursos, oficinas, lazer e eventos culturais. Dona Sebastiana Patricia, de 61 anos, moradora da comunidade, afirma que o monumento é importante “para não perder a cultura indígena, a essência”.

A importância não fica restrita apenas aos limites da aldeia. Para Doglas Sebastião, representante do projeto Rede de Saberes da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), que veio da aldeia Água Branca na cidade de Aquidauana, o Memorial é um ambiente de identificação pessoal, por conta da utilização da língua terena e da história presente no artesanato. Outro lugar que traz essa memória é a Feira Indígena, localizada no entorno do Mercadão Municipal, que conta com a estátua da Índia Terena carregando consigo um cesto com alimentos. O monumento representa histórias de diversas mulheres indígenas, que assim como a mãe de Doglas, vinham para a capital vender produtos orgânicos de suas respectivas regiões.

As memórias se estendem até as lembranças da merendeira de 42 anos, Lauziane José, que aos doze anos passava os dias na feira ajudando a sua mãe nas vendas, dormindo no chão perto do Mercadão. As duas histórias protagonizadas por personalidades diferentes, Doglas e Lauziane, compartilham as mesmas raízes, mães que saem de suas aldeias em busca de sustento e transformam a praça Comendador Oshiro Takemori em um espaço de afirmação da cultura indígena.

Uma tradição familiar


Atualmente, Lauziane preserva a trajetória da Feira Indígena estando presente nos quiosques, ou em suas palavras, nas “ocas” e repassando a história para os mais novos. “Nós falamos muito da feira indígena para que saibam como começamos a trabalhar aqui para conseguir o sustento deles”.

Os monumentos são uma forma de “mostrar o respeito por indígenas”, diz Doglas. O registro da vida de diversos povos indígenas é eternizado nas estruturas espalhadas pela cidade, uma homenagem dedicada através de cada centímetro de construção. A preservação estrutural vista no Memorial é para Doglas uma consequência de ele “estar dentro de uma comunidade indígena”.

Durante quatro anos, o Memorial foi negligenciado pelos administradores da cidade, como conta Maria: "o memorial foi depredado [...] aqui virou ponto de usuário [de drogas], os artesanatos foram todos quebrados’’.

Os registros de depredação que marcaram o Memorial deram espaço para o caderno de brochura que se coloca para além das fronteiras nacionais por carregar consigo o nome de cada visitante dos mais variados países que por lá passaram. O pontapé para essa mudança foi a atenção internacional recebida pelo Memorial através das doações da embaixada do Canadá pelo programa “Fundo Canadá para Iniciativas Locais”, que permitiram a revitalização do espaço concluída em 2018.

Atenção igual não foi dada a outros monumentos indígenas de Campo Grande. O Parque das Nações Indígenas possui quatro deles em seu interior, sendo um o Monumento ao Índio, uma estrutura em forma de zarabatana, que ao adentrá-lo, o visitante é surpreendido com diversas pichações. “Tem que ter um cuidado, sabe, tem que ter. Já que é para representar alguém, esse alguém tem história’’ diz Maria Auxiliadora.


Marcas da passagem de visitantes

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2 comentarios


liviaf.freitas.lvf
05 sept 2023

Matéria muito interessante, adorei!

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nathana.nunes2005
05 sept 2023

Arrasaram

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