O Memorial de Cultura e Cidadania Apolônio de Carvalho assistiu ao surgimento do estado e hoje eterniza a sua cultura
Clara Dias Garcia Pereira e Júlia de Cássia Diehl Pinelli
Na Avenida Fernando Corrêa da Costa há um prédio que pegou o Mato Grosso do Sul no colo quando ainda era um bebê. O memorial de cultura e cidadania Apolônio de Carvalho observou a identidade sul-mato-grossense nascer, e nada mais justo que ele seja o guardião do acervo cultural do Estado.
O prédio, na Avenida Fernando Corrêa da Costa, nasceu junto com o MS. Foto: Clara Dias
O prédio construído em 1976 nasceu junto com o estado do Pantanal, tendo em si a semente da história cultural do Mato Grosso do Sul. Seu nome de batismo era Edifício das Repartições Públicas Estaduais (ERPE), foi encomendado pelo então governador José Garcia Neto para dar vida à prefeitura da terra morena. Com a construção de uma zona administrativa maior no Parque dos Poderes em 1983, foi alocado o Tribunal de Justiça no prédio, e então se tornou o fórum municipal. Em 2003, durante o mandato de governador José Orcírio Miranda dos Santos (Zeca do PT) foram iniciadas as reformas no edifício para que ele se tornasse a casa do Memorial de Cultura do Estado, sendo inaugurado no dia 11 de outubro de 2006, aniversário de 40 anos do desmembramento entre Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.
Sua estrutura de concreto exposto possui oito andares que parecem propositalmente desencaixados, como uma torre de blocos de montar. Com as revitalizações em 2003, sua estrutura original foi alterada. Mas, o prédio não é somente concreto e ferro, suas raízes na arquitetura moderna também traduzem a emoção e beleza de sua construção. Enquanto a Casa do Artesão, a Morada dos Baís e a Casa de Cultura (edifícios com valor histórico-cultural construídos anteriormente à divisão do estado) possuem traços que remetem ao Art Déco carioca, o memorial possui elementos geométricos e brutalistas, que remetem ao modernismo paulistano. A arquiteta e urbanista Bianca Monteiro explica que a escolha do estilo não foi proposital, o modernismo arquitetônico buscava trazer a funcionalidade e a modernidade dos espaços públicos, tendo suas raízes no período pós Segunda Guerra, simbolizando as ideias de inovação pensadas para o recém-nascido estado.
A entrada do prédio mostra uma grande escadaria de pedras que dá acesso a um pátio com o busto esculpido em bronze de Harry Amorim Costa (primeiro governador eleito do estado). No térreo, à esquerda, se encontra a Biblioteca Pública Estadual Dr. Isaías Paim, que possui um acervo de 44 mil publicações, desde filosofia grega até clássicos da literatura brasileira. No salão principal, à direita, há o Centro Referencial de Artesanato no MS, que expõe diversas peças artísticas de consagrados artesãos sul-mato-grossenses.
Avançando para o primeiro andar está localizado o Museu de Arqueologia da UFMS - MuArq da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Lá, se realizam pesquisas sobre o passado arqueológico do Estado, com uma exposição de artefatos e fotos pertencentes aos povos originários. Além do museu expositivo, há também um arquivo próprio no fundo do andar. Em nossa visita, pudemos passear por descobertas históricas, observando de perto os ornamentos de argila, as pontas de flechas, e todo o tipo de artefato encontrado no MS.
Subindo para o segundo andar, nos deparamos com o Arquivo Público Estadual - APE. Sua responsabilidade é garantir a preservação da memória histórica do MS. Atualmente, este andar possui uma exposição de fotos e registros que contam toda a história da divisão do MS e MT. Os dois professores responsáveis pelo APE, Paulo Edyr Bueno e Marcos Vinicius Santos, afirmam que a preservação e a exposição desses documentos são de extrema importância para o reconhecimento da história do Estado, porém quando visitamos seu andar, não percebemos a exposição, que não estava sinalizada - os professores lamentam que seus eventos não sejam prioridade.
Já no terceiro piso, encontramos provavelmente a mais famosa atração do prédio, o Museu da Imagem e do Som - MIS, com mais de 8 mil fotografias, filmes, vídeos, cartazes, discos de vinil, objetos e registros sonoros. O museu tem a missão de preservar a memória cultural do Estado, promovendo eventos e visitação no local.
O memorial leva o nome do corumbaense Apolônio de Carvalho, que foi um importante militante libertário a favor das causas sociais.
Ele ajudou a fundar o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) e lutou não apenas contra a ditadura brasileira, mas também contra o regime fascista de Franco na Guerra Civil Espanhola, e contra os avanços do nazismo sendo coronel da Resistência Francesa na Segunda Guerra Mundial. Ao fundo do primeiro andar do prédio está localizada uma exposição em sua homenagem, contando com fotos, molduras e objetos remetentes à vida de Apolônio de Carvalho. A exposição tem a iniciativa de apresentar ao povo sul-mato-grossense, a história desse herói nacional e regional que, infelizmente, não possui muita visibilidade.
Nas paredes do memorial, a vida de Apolônio de Carvalho Foto: Júlia de Cássia Diehl
O memorial de cultura e cidadania Apolônio de Carvalho tem como função a preservação e a divulgação da cultura sul-mato-grossense, e cada andar tem um papel único na conclusão dessa tarefa. Esse prédio, além de ser parte fundamental do nascimento do MS, também abriga o trabalho para que sua história não seja esquecida. Assim, a cultura da terra morena segue viva dentro dessas paredes de concreto.
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